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terça-feira, 26 de janeiro de 2016

IGREJA SEM PROPÓSITO?

Entrevista com Alfredo dos Santos Oliva




Não são poucas as vezes em que ouvimos pessoas tecerem críticas ácidas a católicos que foram batizados na infância, que se auto identificam como tais e que até vão de vez em quando à missa, mas que não assumem um compromisso consistente  com o evangelho. Existe uma palavra para designar esse modo frio e indiferente de se relacionar com Deus: nominalismo. 

Parecia que o nominalismo era uma questão que afetava apenas os católicos. Esse quadro, contudo, está mudando na atualidade.Com o crescimento numérico expressivo dos evangélicos, o que é muito bom, começa a propagar-se também um câncer espiritual, o que é péssimo para nós. Essa doença grave produz o "crente chuchu", com altas dosagens de indiferença e de acomodação. 

Este é o tema do capítulo 5 do livro "Uma Igreja sem propósitos", organizado por Jorge Henrique Barro. Este capítulo escrito por Alfredo dos Santos Oliva intitulado de "Uma Igreja sem o propósito de uma espiritualidade fervorosa e comprometida", nos lembra  que há gente que não é frio nem quente, que diz que não precisa de nada, sendo espiritualmente indiferentes e arrogantes. Mas, também, mostra que Jesus nos chama para uma conversa séria sobre nossa espiritualidade, repeendendo e disciplinando àqueles que Ele ama e os convidando para uma relação de intimidade.

Alfredo dos Santos Oliva é graduado em História pela Universidade Estadual de Londrina e em Teologia pelo Seminário Teológico Antônio de Godoy Sobrinho, com mestrado em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará, mestrado em Teologia pelo Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil e doutorado em História pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Atualmente é professor adjunto da Universidade Estadual de Londrina. É líder na Comunidade Nova Aliança de Londrina-PR.
  foto de Alfredo dos Santos Oliva
No Capítulo 5 do livro "Uma Igreja sem Propósitos" você aborda o crescimento do nominalismo evangélico. Quais são as causas deste crescimento?
Creio que o nominalismo evangélico pode ser explicado a partir de vários fatores. Destaco dois deles: 1. a aceleração do crescimento dos evangélicos, em princípio um fator positivo, também tem seus efeitos colaterais; quanto mais evangélicos existirem no nosso país, mais chances teremos de que existam crentes nominais; para mim, é uma questão matemática bem simples; 2. algumas igrejas evangelizam bastante, mas não se dedicam com a mesma intensidade à tarefa de discipular e integrar os novos adeptos no seu interior, criando uma massa de pessoas sem um identidade cristã bem definida.
Como posso identificar os espiritualmente indiferentes?
Creio que sejam pessoas "viciadas" em igreja. Muitas vezes freqüentam sua comunidade de forma assídua, mas não se empenham em ser coerentes na vida prática com aquilo que ouvem ou mesmo com aquilo que creem. Uma vez ouvi de uma mulher, em uma igreja que eu acabara de chegar para substituir o seu pastor, que ela gostava de alimentar bem. Ela se referia ao fato de gostar de consumir sermões bem preparados. Creio que ela era uma dessas pessoas que podemos definir como crentes nominais. Uma pessoa madura e bem alicerçada na Palavra de Deus não diria uma coisa dessas a um pastor que está chegando. A ela respondi que gostava de ovelhas que se empenhavam em viver o que sabiam da Palavra de Deus. No meu modo de ver, não importa o quanto conhecemos da Bíblia, mas o quanto vivemos o que sabemos. Quanto mais sabemos, mais aumenta a nossa responsabilidade.
O que dizer da Igreja de Laodicéia, exemplo de uma igreja fria, indiferente, arrogante e auto-suficiente?
Creio que as cartas às sete igrejas do Livro do Apocalipse nos deixam exemplos de cuidados que devemos ter em relação à vida cristã. Laodiceia era uma igreja tipicamente cheia de crentes nominais. O pior de tudo é que a sua arrogância não permitia que enxergasse seus próprios erros, dentre eles o seu nominalismo indecente. A estes só resta ouvir o chamado de Jesus para uma vida de intimidade com Ele. O remédio para a arrogância e a frieza é um encontro íntimo com o Senhor Jesus. Só Ele pode nos curar e nos arrancar de nossa indiferença.
A severidade da conversa sobre a espiritualidade de Laodicéia revela a podridão da Igreja, mas também a misericórdia de Deus. O que significa?
Aprendi com C. S. Lewis que somos mais exigentes com aquelas pessoas que amamos e estão mais próximas de nós. A exortação severa de Jesus aos crentes nominais de Laodiceia é um exemplo vivo do amor de Deus. Ele não pode observar apenas um comportamento inadequado. Isso é contrário ao seu grande amor misericordioso. Se há severidade na exortação, é porque Deus amava demais àquelas pessoas. Devemos ficar felizes todas as vezes que somos confrontados por Deus, pois não pode haver maior demonstração de amor do que uma exortação sincera e direta. Só os nossos grandes amigos ousam fazer isso conosco e vice-versa.
Como podemos nos tornar íntimos de Deus, dentro de uma igreja de Laodicéia?
Penso que aí é que mora o grande desafio. Quando estamos em uma igreja tragada pelo nominalismo, nos tornamos presas fáceis dele. O melhor seria estar em uma igreja que tivesse uma atmosfera de compromisso e amor para com Deus e para com o próximo. É responsabilidade da liderança da igreja desafiá-la a estar fervorosamente comprometida com Deus, o tempo todo. Quando estamos em um ambiente sadio, temos melhores condições de enfrentar os momentos pessoais de desânimo, pois sempre vai haver alguém em uma situação espiritual melhor que a nossa para nos amparar e estimular. O cristianismo é uma religião comunitária. Não pode haver espiritualidade sadia no meio de um ambiente insano.
Quais os conselhos para pastores e líderes que desejam uma igreja fervorosa e comprometida?
Algumas estratégias que acredito serem importantes: 1. criar uma estrutura de pequenos grupos, onde a comunhão, o amparo mútuo e a vivência de uma espiritualidade fervorosa possam se concretizar; 2. estabelecer uma rede de mentoria e discipulado mútuo e permanente para que uns possam ancorar o crescimento espiritual do outros; 3. estimular constantemente o que conhecemos como práticas devocionais: leitura diária da Palavra de Deus, oração diária (pessoal, em família ou em grupo), meditação teológica com aplicação pessoal, prática da disciplina do jejum etc; 4. celebração de cultos fervorosos (com louvor e adoração vibrantes) e desafiadores (com apelos ao crescimento espiritual e ao compromisso com a Palavra de Deus); 5. criar redes fraternas de relacionamento entre igrejas para que possam partilhar e aprender a partir de experiências positivas de crescimento espiritual; 6. os pastores e líderes devem ter um espírito humilde, de modo que possam estar abertos a serem mentoreados enquanto exercem suas funções.

Reprodução Autorizada desde que mantida a integridade dos textos, mencionado o autor e o